1.22.2009

Procura-se um amigo


Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimento, basta ter coração.
Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir.
Tem que gostar de poesia, da madrugada, de pássaros, de sol, da lua, do canto dos ventos e das canções da brisa.
Deve ter amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor.
Deve amar o próximo e respeitar a dor que os passantes levam consigo.
Deve guardar segredo sem se sacrificar.
Não é preciso que seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja de segunda mão. Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados. Não é preciso que seja puro, nem que seja de todos impuro, mas não deve ser vulgar.
Deve ter um ideal e medo de perdê-lo e, no caso de assim não ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa.
Tem que ter ressonâncias humanas, seu principal objetivo deve ser o de amigo.
Deve sentir pena das pessoas tristes e compreender o imenso vazio dos solitários.

Deve gostar de crianças e lastimar as que não puderam nascer.
Procura-se um amigo para gostar dos mesmos gostos, que se comova quando chamado de amigo.
Que saiba conversar de coisas simples, de orvalhos, de grandes chuvas e das recordações da infância.
Precisa-se de uma amigo para não enlouquecer, para contar o que se viu de belo e triste durante o dia, dos anseios e das realizações, dos sonhos e da realidade.
Deve gostar de ruas desertas, de poças de água e de caminhos molhados, de beira de estrada, de mato depois da chuva, de se deitar no capim.


Precisa-se de um amigo que diga que vale a pena viver, não porque a vida é bela, mas por que já se tem um amigo.

Precisa-se de um amigo para se parar de chorar. Para não viver debruçado no passado em busca de memórias perdidas. Que bata nos ombros sorrindo e chorando, mas que nos chame de amigo, para ter-se a consciência de que ainda se vive.


Vinícius de Moraes